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As três pecuárias no Brasil

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Quanto mais se fala da pecuária brasileira, mais as ideias distorcidas se multiplicam. Onde está o erro? É preciso entender que o Brasil não possui uma pecuária, mas três: a exportadora, a de fronteira e a familiar. Qualquer avaliação que não leve em conta a diferença entre esses três sistemas está fadada ao erro.

Não dá para entender a pecuária brasileira do ponto de vista de somente uma dos três sistemas. Vejamos um exemplo. No sábado passado, o Maurício de Palma Nogueira, coordenador do Rally da Pecuária, respondeu, na Folha de São Paulo, a um estudo assinado por nós com outros especialistas (“Do Pasto ao prato: subsídios e pegada ambiental da carne bovina“) . Junto com uma ótima análise, ele fez a afirmação pra lá de surpreendente de que na cadeia da carne não existe sequer um Real de subsídio vindo do governo!

Será mesmo que não existe subsídio na produção de carne no Brasil? Na verdade, em 2018, o volume de crédito absorvido pela pecuária foi de R$ 50 por cada cabeça de gado. Ainda que esse valor possa ser baixo, é difícil dizer que ele não existe.

Por que, então, a interpretação de que a pecuária não teria subsídios?

Julgar a pecuária brasileira somente do ponto de vista da pecuária exportadora, altamente tecnificada – baseada em cruzamentos de alto rendimento, integração com a lavoura e terminação em confinamento – não faz sentido. Quem trabalha cotidianamente com essa pecuária de grande escala pode achar que ela não faz uso e não precisa de subsídios. Mas essa ideia está errada: em 2018, dois terços do volume de crédito rural foram contratos acima de R$ 500 mil. Ou seja, a pecuária exportadora absorveu crédito, sim.

Também não faz sentido acreditar que a pecuária brasileira se resume à pecuária de fronteira, que é minoritária. Segundo a Embrapa, só 3% dos produtores rurais da Amazônia estão envolvidos com algum desmatamento. A pecuária de fronteira dá muita manchete, mas representa pouco. Em termos de subsídios, ela também recebe pouco porque opera à margem da economia formal, o que dificulta a tomada de crédito no banco.

Por fim, a pecuária familiar é de menor escala mas emprega bastante mão-de-obra. Essa produção abastece os mercados locais, chega às populações de baixa renda, e é a guardiã do tecido social do campo. A pecuária familiar é fundamental para manter o homem no campo e para preservar a cultura da roça.

Quanto a questão dos subsídios.

Os subsídios são muito reais, mas eles afetam diferentemente cada uma das três pecuárias. A pecuária de exportação é a mais sensível aos subsídios porque concorre diretamente com países que fornecem muito mais subsídios do que o Brasil, como EUA e países europeus. Já a pecuária de fronteira é muito pouco afetada pela estrutura de subsídios. Por fim, a pecuária familiar tem acesso a juros subsidiados quando possui um nível mínimo de formalização, o que não é sempre o caso. E aí é que mora o problema, pois o produtor brasileiro precisa conseguir trabalhar antes de ter acesso a subsídios. Na prática, isso significa simplicar os processos burocráticos para que o produtor não tenha que esperar uma eternidade antes de receber uma autorização escrita para trabalhar.